Porque a circularidade não pode ser um clube exclusivo

Imagem de uma porta velha com duas folhas de madeira com uma corrente e um cadeado fechado e travando a abertura das portas ilustram artigo que aborda porque a circularidade não pode ser um clube exclusivo.
Uma porta desgastada com cadeado e corrente. Foto: Tom D'Arby/Pexels.

Um artigo recente da Grist chamou a atenção para a Circularidade 23 em termos não muito lisonjeiros. Ele pintou a circularidade como um movimento sem definição, desenfreado com o greenwashing corporativo e obcecado pela reciclagem. Embora nenhum dos pontos seja 100% incorreto, eles parecem generalizações excessivas que justificam uma resposta. Vamos mergulhar brevemente em cada um deles para sugerir porque a circularidade não pode ser um clube exclusivo.

Falta uma definição

O repórter Joseph Winters, assim como várias pessoas que citou, argumentou que a economia circular não está bem definida.

Com todo respeito, discordo. A economia circular pode significar e significa muitas coisas, e pode ser definida de forma diferente dependendo do seu lugar na economia. Mas dizer que a economia circular não está bem definida é admitir que qualquer coisa que exija mais de uma frase para ser descrita é indefinível.

Um dos melhores exemplos de uma definição sobre economia circular que já vi vem do Parlamento Europeu:

A economia circular é um modelo de produção e consumo, que envolve compartilhar, locar, reutilizar, reparar, renovar e reciclar materiais e produtos existentes pelo maior tempo possível. Dessa forma, o ciclo de vida dos produtos é estendido.

Na prática, isso implica reduzir ao mínimo o desperdício. Quando um produto chega ao fim de sua vida útil, seus materiais são mantidos na economia sempre que possível graças à reciclagem. Estes podem ser utilizados de forma produtiva repetidas vezes, criando assim mais valor.

É importante lembrar que a sustentabilidade, em alguns aspectos, ainda não é facilmente definida. Nós nos esforçamos para viver dentro dos limites planetários, e a economia circular e a sustentabilidade são estruturas úteis para guiar esse trabalho, mesmo quando o consenso geral é que nunca chegaremos até lá.

Como comparação, um imperativo relacionado a negócios é a qualidade do produto. Temos medidas objetivas para mostrar o progresso na qualidade (como defeitos por milhão, reclamações de garantia e longevidade do produto), mas sabemos que nunca atingiremos o ponto em que não há mais melhoria de qualidade a ser feita.

Assim como a qualidade do produto é definida pelas métricas usadas para rastreá-lo, a circularidade também é. Enviar menos [lixo] para aterros, incinerar menos material, lançar menos plástico no meio ambiente, diminuir a extração de matéria-prima, aumentar a reutilização e outras métricas podem medir o progresso na direção de uma economia circular.

É apenas greenwashing

O artigo da Grist cita um ativista do Greenpeace Canadá dizendo: “Neste momento, sempre que ouço a frase ‘economia circular’, assumo que é greenwashing“.

Essa atitude fatalista é uma das muitas razões pelas quais não estamos progredindo de forma significativa na direção da circularidade. Quando indivíduos e grupos de defesa ignoram os investimentos e esforços que as corporações estão fazendo para melhorar suas práticas, isso apenas desincentiva esforços futuros. Da mesma forma, quando as corporações desprezam os apelos de melhoras vindos dos clientes, isso reforça a ideia de que elas existem apenas para obter lucros.

Estou defendendo que as corporações gritem do alto das montanhas por cada melhoria incremental em seus produtos ou embalagens? Absolutamente não. Seria greenwashing dizer que você melhorou a característica de reciclagem da garrafa plástica mudando-a de verde colorido para PET transparente? Também não. Este tipo de progresso na característica de reciclagem é incremental, mas não deixa de ser um progresso.

Assim como acontece com todos os outros problemas desafiadores que uma população global enfrenta, é necessário um pouco de nuance que muitas vezes se reduz ao preto e branco. Vai levar tempo para que o tema da economia circular se mova da periferia das estratégias das grandes corporações para o centro.

Sinônimo de reciclagem

O artigo da Grist citou alguém de uma organização sem fins lucrativos dizendo que “saiu da conferência com a sensação de que a circularidade tenha se tornado sinônimo de reciclagem”. Sim, o foco descomunal na reciclagem é frustrante, mas este é um exemplo de encontro com grandes corporações onde elas estão. Chegamos a um momento no século 21 em que não podemos reciclar nossa maneira de sair da bagunça que criamos, mas também não podemos sair da bagunça sem reciclar.

Embora não exista um sistema circular para todos os plásticos, é problemático para o movimento da economia circular excluir totalmente das discussões as grandes empresas que produzem e usam plásticos. Algumas empresas são, paradoxalmente, parte do problema e chave para implantar soluções em escala – e é importante incluí-las nessas conversas críticas.

Para o bem ou para o mal, os plásticos exercem um papel na sociedade. Devemos reconhecer que todos os materiais produzem impactos, e que não existe um que seja inerentemente bom ou ruim. Em vez disso, a forma como os materiais são obtidos e gerenciados determinará seu verdadeiro impacto.

Certos materiais tóxicos continuam tendo um papel fundamental a desempenhar em nossa economia até encontrarmos uma alternativa viável. Continuaremos incentivando nosso público a fazer melhorias, seja por inovações na direção da circularidade, pelo engajamento com organizações que se esforçam por mais progresso ou chamando a atenção quando erram.

Na medida em que priorizamos um design melhor, bem como a redução e a reutilização em vez da reciclagem, podemos elevar nossa ambição coletiva na direção de uma economia global sustentável.

Com algumas pessoas assumindo a posição de que os combustíveis fósseis e os plásticos não pertencem à economia moderna, e outras assumindo a posição de que eles precisam fazer parte do futuro, como avançaremos?

Neste momento eu apenas tenho uma ideia. Quer sejamos consumidores individuais ou profissionais de corporações, grupos de defesa ou agências governamentais, a colaboração é fundamental no trabalho em direção a uma economia circular. Não podemos atender às necessidades de um planeta com mais de 8 bilhões de pessoas, viver dentro dos limites planetários, melhorar os desafios da injustiça ambiental e tomar partido uns contra os outros. Encontrar um terreno comum e fazer progressos constantes é o único caminho. Podemos almejar a perfeição, mas não podemos esperar que isso aconteça amanhã.

Artigo original (em inglês) publicado por Jon Smieja na GreenBiz.

Sobre o autor
Jon Smieja é vice-presidente e analista sênior de economia circular no Grupo GreenBiz, onde lidera a estratégia, programas e parcerias de circularidade da empresa. Sua equipe conecta as partes interessadas e as soluções de toda a cadeia de valor para cultivar uma comunidade de prática, na qual os profissionais são capacitados para transformar produtos, organizações, indústrias e sistemas.  Twitter:
@jonsmieja

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