Implante de chips cerebrais foi aprovado para testes em humanos
Após anos de controvérsia, incluindo denúncias de “trabalhos“ experimentais apressados que resultaram em até 1.500 mortes de animais, a empresa de implantes de chips cerebrais de Elon Musk [dono da Tesla, fabricante de veículos elétricos] começou a fazer o recrutamento para seu primeiro teste histórico. Ou seja, o implante de chips cerebrais foi aprovado para testes em humanos apesar de fracassar em animais. Continue lendo para entender.
“Estamos felizes em anunciar que recebemos a aprovação do conselho de revisão institucional para que o nosso primeiro local hospitalar inicie o recrutamento de pessoas que farão parte do primeiro ensaio clínico que realizaremos em humanos”, disse a Neuralink em um comunicado.
“O Estudo PRIME – abreviação de Precise Robotically Implanted Brain-Computer Interface” [Interface Cérebro-Computador Implantada Roboticamente de Forma Precisa, numa tradução livre] – “é um teste inovador de dispositivos médicos experimentais para nossa interface cérebro-computador (BCI) totalmente implantável e sem fio”. O teste visa avaliar a segurança de nosso implante (N1) e robô cirúrgico (R1) e avaliar a funcionalidade inicial de nossa BCI para permitir que pessoas com paralisia possam controlar dispositivos externos com seus pensamentos.
“O robô R1 será usado para colocar cirurgicamente os fios ultrafinos e flexíveis do implante N1 em uma região do cérebro que controla a intenção de movimento”, continuou o comunicado. “Uma vez no lugar, o implante N1 é cosmeticamente invisível e destina-se a gravar e transmitir (sem o uso de fios) sinais cerebrais para um aplicativo que decodifica a intenção de movimento. O objetivo inicial de nossa BCI é permitir que as pessoas tenham a capacidade de controlar um cursor ou o teclado do computador usando apenas seu pensamento.”
Como esperado, o primeiro teste em humanos tem critérios rigorosos para a seleção. Para serem elegíveis, os participantes devem ter tetraplegia (função limitada nos quatro membros) decorrente da lesão medular ou ter esclerose lateral amiotrófica (ELA) e estar convivendo pelo menos há um ano com a lesão (sem melhora).
Os participantes devem ter 22 anos de idade ou mais e também ter um cuidador. No entanto, serão excluídas quaisquer pessoas neste grupo que também sejam propensas a convulsões, tenham implantes ativos – como um marca-passo – ou necessitem de ressonâncias magnéticas contínuas ou tratamentos semelhantes.
A Neuralink também convida qualquer pessoa a fazer parte de seu Registro de Pacientes, por conta da expectativa de continuidade dos testes.
A previsão é que o estudo dure seis anos, com monitoramento constante. A primeira etapa – Estudo Primário – incluirá nove consultas clínicas e domiciliares ao longo de 18 meses. Depois disso, os pacientes terão que se comprometer com 20 consultas ao longo de cinco anos.
Em seguida, as Sessões de Pesquisa BCI serão conduzidas durante todo o teste e exigirão duas sessões de uma hora por semana.
Em maio, a Food and Drug Administration (FDA) [agência reguladora do governo americano, ligada ao Ministério da Saúde] deu luz verde à Neuralink para realizar testes em humanos. Esta foi uma mudança rápida de tom em relação à posição da FDA dois meses antes, quando a agência supostamente recusou a aprovação do teste, citando preocupações de segurança. (Na época, a FDA se recusou a comentar.)
“Estamos animados em compartilhar que recebemos a aprovação da FDA para lançar nosso primeiro estudo clínico em humanos!”, tuitou a Neuralink em 25 de maio. “Este é o resultado de um trabalho incrível da equipe da Neuralink em estreita colaboração com a FDA e representa um primeiro passo importante que um dia permitirá que nossa tecnologia ajude muitas pessoas.”
“[O Estudo PRIME] representa um passo importante em nossa missão de criar uma interface cerebral generalizada para restaurar a autonomia daqueles com necessidades médicas não atendidas”, acrescentou a empresa.
Fundada em 2016 por Musk, o objetivo da Neuralink tem sido desenvolver uma interface de chip cerebral que, quando implantada no crânio, possa restaurar com sucesso o movimento, a comunicação e – potencialmente – a visão de pessoas com uma ampla gama de deficiências.
Entretanto, [a Neuralink] rapidamente gerou polêmica. Em fevereiro de 2022, a empresa enfrentou alegações de má gestão que resultaram na morte de macacos em seu laboratório de testes iniciais na Universidade da Califórnia (UC), em Davis. A Neuralink e a universidade divulgaram comunicados afirmando que tomaram cuidados com todos os espécimes vivos.
“Dois animais foram submetidos à eutanásia em datas planejadas para que dados histológicos importantes pudessem ser coletados, e seis animais tiveram o mesmo destino mediante recomendações médicas da equipe de veterinária da UC Davis”, diz o comunicado da Neuralink.
“Os motivos dessas mortes incluem uma complicação cirúrgica envolvendo o uso do produto aprovado pela FDA (o BioGlue), uma falha do dispositivo e quatro suspeitas de infecções associadas ao dispositivo – risco inerente a qualquer dispositivo médico percutâneo. Em resposta a isso, nós desenvolvemos novos protocolos cirúrgicos e um design de dispositivo totalmente implantado para futuras cirurgias”, disse a empresa.
No entanto, apesar desta declaração intitulada Compromisso da Neuralink com o Bem-Estar Animal, um relatório condenatório da Reuters em dezembro de 2022 detalhou dezenas de documentos e entrevistas com mais de 20 funcionários (atuais e antigos) da empresa, que revelaram excesso de crueldade e mortes desnecessárias de animais – 1.500 desde 2018 – e muitas delas decorrentes da velocidade vertiginosa em que o projeto estava se movendo.
Não obstante, após o Escritório do Inspetor-Geral do Departamento de Agricultura abrir um inquérito para investigar violações da Lei do Bem-Estar Animal, a Neuralink foi inocentada em março.
Não se sabe quantos pacientes humanos serão aprovados para o histórico Estudo PRIME, da Neuralink.
Fonte: Neuralink
Artigo original (em inglês) publicado por Bronwyn Thompson na New Atlas.
Sobre a autora
Bronwyn Thompson tem diplomas de jornalismo e zoologia e possui mais de 20 anos como escritora e editora. Ela tem interesse particular em neurociência, genética, comportamento animal e biologia evolutiva. Em fevereiro de 2023, Bronwyn encontrou um lar feliz na New Atlas.