As reservas de hidrogênio e a corrida do ouro pela energia limpa

Imagem de uma planta de hidrogênio (gerada por I.A.) situada em um vale verdejante com um pôr do sol ao fundo ilustra post que fala sobre as reservas de hidrogênio e a corrida do ouro pela energia limpa.
Por centenas de anos uma energia mais limpa que a do hidrogênio verde está disponível em depósitos rochosos e explorável como o gás natural. Uma nova corrida do ouro ao hidrogênio está começando. IA gerada por DALL-E/New Atlas.
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hidrogênio natural preso no subsolo em quantidade suficiente para atender a todas as demandas projetadas por centenas de anos. Um relatório inédito do Serviço Geológico dos EUA identifica-o como um novo recurso primário e dispara a pistola de partida para uma nova corrida do ouro.

A corrida do “ouro negro” nos EUA começou em 1859, quando Edwin Drake meteu uma estaca no solo da Pensilvânia e o petróleo começou a jorrar. A corrida do hidrogênio dourado pode ter um momento semelhante para apontar.

Em 1987, como Mamadou Ngulo Konaré conta a história, os escavadores de poços desistiram de um poço seco de 108 m, mas ele e outros moradores da vila de Bourakébougou, no Mali, notaram que o vento estava soprando para fora do buraco. Quando um dos perfuradores olhou para dentro do buraco [enquanto] fumava um cigarro, houve uma explosão em seu rosto, resultando em queimaduras graves e num incêndio enorme.

Esse incêndio, como [o periódico] Science mencionou Konaré, queimou “como água gasosa azul e não apresentava fumaça preta. A cor do fogo à noite era como ouro reluzente”.

Demorou semanas para apagar o fogo e tapar o buraco, mas análises posteriores mostraram que o gás que saía era 98% de hidrogênio puro. Serviram mangas em comemoração.

Alguns anos depois, um pequeno gerador Ford de 30 kW foi ligado, e Bourakébougou tornou-se a primeira vila do mundo a desfrutar dos benefícios do hidrogênio limpo e natural como fonte de energia verde.

Em 2012, uma empresa chamada Petroma (agora Hydroma) colocou em Bourakébougou, Mali, o primeiro gerador do mundo movido a hidrogênio natural de emissão zero. Hydroma.

Passamos muito tempo nos últimos anos cobrindo novas maneiras de gerar hidrogênio verde usando energia renovável – é um combustível limpo altamente promissor com todos os tipos de aplicações.

Armazenado como um líquido criogênico ou um gás pressurizado, ele pode ser queimado como substituto do combustível de hidrocarbonetos, com modificações relativamente pequenas nos motores a combustão. Ele também pode gerar eletricidade a partir de uma célula de combustível, agindo como uma espécie de bateria líquida/gasosa.

Todavia, em geral, para produzi-lo, é preciso muita água doce – cerca de 9 litros de água para cada 1 kg de hidrogênio produzido. E o processo de eletrólise, apesar de estar melhorando, ainda é deficitário. Então, toda vez que você desvia energia renovável preciosa da rede para produzir hidrogênio, você está jogando alguma porcentagem fora. Isso parece um pouco desperdiçador, por conta das enormes e crescentes demandas energéticas que as redes em todo o mundo precisam satisfazer, ao mesmo tempo em que se livram das fontes de energia baratas, fáceis e sujas do passado.

O hidrogênio é tão trabalhoso de armazenar em pressões atmosféricas que talvez a ideia de hidrogênio geológico, preso nas rochas sob nossos pés como gás natural, não tenha passado pela cabeça das pessoas. Talvez houvesse a suposição de que as moléculas de hidrogênio de ocorrência natural se contorceriam através da rocha sólida para escapar para a atmosfera, como às vezes fazem em recipientes de armazenamento, ou que haviam sido consumidas por micróbios. Talvez simplesmente ele nunca tenha sido visto como um recurso tão valioso até o pivô relativamente recente em direção a transportes limpos, energia limpa e emissões de carbono zero até 2050.

De qualquer forma, a situação agora mudou, e muito. Geoffrey Ellis, do Serviço Geológico dos Estados Unidos, tem investigado o potencial global do hidrogênio dourado como um novo recurso primário. Em uma reunião em Denver da Associação Americana para o Avanço da Ciência, ele antecipou os resultados de um estudo ainda não publicado, de acordo com o Financial Times.

Em suma, há até 5,5 trilhões de toneladas de hidrogênio em reservatórios subterrâneos em todo o mundo. Pode ter sido gerado pela interação de certos minerais ricos em ferro com a água subterrânea. Em alguns casos, ele pode ser misturado com outros gases, como o metano, do qual precisaria ser separado. Mas está lá, em quantidades tão extraordinárias que os analistas esperam uma corrida do hidrogênio dourado em escala global.

Pode não ser super fácil de chegar: “A maioria do hidrogênio provavelmente é inacessível”, disse Ellis ao Financial Times, “mas um percentual de sua extração ainda supriria toda a demanda projetada – 500 milhões de toneladas por ano – por centenas de anos.”

O hidrogênio dourado não consumirá energia renovável como eletrolisadores, nem a desviará de outras oportunidades de descarbonização. Nesse sentido, você poderia argumentar que ele terá o potencial de ser significativamente mais verde do que o hidrogênio verde. Por outro lado, se sua extração liberar metano na atmosfera, isso será um problema sério, pois o metano é em torno de 85 vezes mais poderoso como gás de efeito estufa do que o dióxido de carbono em um período de 20 anos.

As empresas provedoras de recursos naturais não procuram hidrogênio há muito tempo, assim estão apenas começando a encontrá-lo e descobrir como extraí-lo de forma limpa e eficiente. Mas as oportunidades aqui são absolutamente imensas e já atraem investimentos robustos. Pelos próximos meses e anos, esperamos ouvir muito mais sobre a tecnologia e as técnicas envolvidas.

Fonte: Financial Times

Artigo original (em inglês) publicado por Loz Blain na New Atlas.

Sobre o autor
Loz Blain passou oito anos perseguindo um diploma de artes na Universidade de Melbourne, Austrália. Sem foco e com deficiência de atenção, ele buscou mais de 30 áreas diferentes de estudo em humanidades e ciências, em uma série de caprichos, antes de se decidir por um curso de psicologia. Desde 2007, Loz é um dos colaboradores mais versáteis da New Atlas e desde então provou ser fotógrafo, cinegrafista, apresentador, produtor e engenheiro de podcast, além de redator sênior.

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