Cidade americana quer remunerar quem trocar grama por plantas nativas

Imagem do jardim residencial cheio de plantas nativas e paisagismo para ilustrar o projeto de lei de uma cidade americana que quer remunerar quem trocar grama por plantas nativas
Paisagismo tolerante a seca. Foto: Be Water Wise

Enfrentando uma mega seca histórica em todo o oeste americano sem fim à vista, os legisladores do Colorado, procurando maneiras fáceis e eficazes de conservar a água, estão de olho [em um tipo de grama chamada] Kentucky Blue Grass.

Não apenas a Kentucky Blue Grass, mas todos os tipos de gramíneas não nativas plantadas em jardins da frente, jardins dos fundos, faixas verdes em frente a empresas e complexos de apartamentos. Esses gramados consomem cerca de metade da água usada nas cidades do Colorado.

“Não há muita água disponível e a que existe está se tornando muito cara”, disse John Berggren, analista de políticas hídricas da Western Resource Advocates. “Então, vamos dar uma olhada em como estamos usando isso agora.”

A organização de Berggren apoia um esforço bipartidário no Capitólio do Colorado para lançar um programa de substituição de grama em todo o estado, que pagaria a proprietários de casas e empresas para substituir seus gramados ornamentais não nativos por plantas e paisagismos melhor adaptados ao clima seco do estado.

A legislação – Projeto de Lei 1151 da Câmara – seria uma maneira eficaz de gerenciar a demanda hídrica do estado, disse o deputado estadual Marc Catlin, R-Montrose, em uma audiência do comitê no final de fevereiro. E a substituição seria inteiramente voluntária.

“Em vez de dizer às pessoas que elas têm que [substituir], esta é uma oportunidade para as pessoas entrarem e dizerem que eu gostaria [de fazer a substituição]”, disse Catlin, vice-presidente do Comitê de Agricultura, Pecuária e Água da Câmara.

Programas semelhantes em todo o Ocidente economizaram bilhões de galões de água, pagando aos proprietários de imóveis desde centavos a alguns dólares por cada metro quadrado de grama substituída.

Esses tipos de programas, que oferecem dinheiro para a remoção de gramados dependentes de água, provavelmente se tornarão mais comuns à medida que estados, condados e cidades de toda a região oeste buscam maneiras relativamente indolores de conservar o recurso, disseram especialistas em água ao jornal The Denver Post.

Mais ou menos 19 cidades, distritos e serviços públicos de água do Colorado já têm programas de substituição de grama. A legislação ofereceria dólares correspondentes para esses programas, aumentando o desconto que os proprietários de imóveis receberiam.

O projeto também ajudaria os governos a lançar seus próprios programas. E as pessoas que vivem em áreas sem esse programa também podem solicitar dinheiro diretamente ao estado.

“Por muito tempo, a Encosta Ocidental e as Planícies Orientais têm carregado o peso para a conservação da água”, disse o deputado estadual Dylan Roberts, D-Steamboat Springs, durante a reunião do comitê de fevereiro.

A proposta dá às áreas metropolitanas a chance de “desempenhar seu papel justo”, disse Roberts.

“O mesmo velho cálculo não funciona mais.”

Talvez a razão mais comum pela qual os gramados sejam tão corriqueiros em todo o Colorado e no oeste seja porque as pessoas estavam acostumadas a tê-los, disse Berggren. À medida que as pessoas se deslocavam da costa leste, de lugares ao redor do Rio Mississippi, de lugares com muita chuva natural e muita água, trouxeram consigo certo desejo estético.

“Elas queriam aquele grande gramado [magnífico]”, disse Berggren. “Elas queriam aqueles parques. Elas queriam aquelas áreas verdes. Parecia bom para muita gente.”

Durante décadas, a estética não foi muito problemática, pois a costa oeste parecia ter água suficiente, disse ele. As pessoas podiam usar a quantidade que quisessem para seus gramados.

Mas com o passar do tempo, climatologistas e especialistas em recursos hídricos começaram a entender que o Rio Colorado estava super usurpado. Então, em 2002, disse Berggren, começou uma mega seca, agravada pelas mudanças climáticas e pelo desenvolvimento explosivo.

“Agora, no século 21, sabemos que a água é mais limitada”, disse ele. “O mesmo velho cálculo não funciona mais.”

A maioria desses gramados e faixas verdes não serve a um propósito, disse Zane Marshall, diretor de recursos e instalações da Southern Nevada Water Authority. São ornamentais.

Certos espaços verdes, como parques e campos esportivos, são o que Marshall chama de funcionais. Programas de substituição de grama, como o do Vale de Las Vegas, focam em gramados não funcionais.

A quantidade de água que as gramíneas e plantas podem exigir depende muito da geografia e do clima regional, disse Marshall, mas em Las Vegas um metro quadrado de grama pode consumir 73 galões de água por ano. Substituir essa grama por plantas nativas e paisagismo pode reduzir isso para 18 galões ou menos.

Imagem de um jardim residencial cheio de plantas nativas e paisagismo para ilustrar o projeto de lei de uma cidade americana que quer remunerar quem trocar grama por plantas nativas
Fotos antes e depois que o dono de uma propriedade na cidade de Castle Rock, estado do Colorado, participou do programa de substituição de grama, o qual oferece dinheiro para residentes dispostos a substituir gramados dependentes de água por paisagismo nativo e mais resistente à seca. Foto: cortesia da cidade de Castle Rock

Estudos de caso em Las Vegas, Greeley e Castle Rock

O vale de Las Vegas sempre foi seco. A região desértica tem uma média de pouco mais de dez centímetros de chuva por ano. As pessoas que vivem lá extraem 90% de sua água do Rio Colorado e o restante de um aquífero subterrâneo da região.

Durante gerações, o abastecimento de água não foi um problema tão grande, disse Marshall. A maioria das casas construídas nos últimos 30 anos tinha sistemas automatizados de irrigação (sprinklers) para seus gramados. Mas perto da virada do século, a água tornou-se menos abundante e as autoridades do vale perceberam.

A empresa hídrica lançou seu programa Water Smart Landscapes Rebate em 1999, disse Marshall, oferecendo aos moradores 40 centavos por cada pé quadrado de gramado que eles estivessem dispostos a substituir.

O programa decolou.

Moradores do Vale, gerentes de apartamentos e donos de empresas pegaram o dinheiro da empresa e substituíram seus gramados sedentos por rochas sedimentares, agave de Nevada e calêndulas do deserto. A empresa hídrica aumentou sua remuneração para US$ 1 por pé quadrado em 2003, depois US$ 2 em 2007.

Agora, a empresa oferece US$ 3 por pé quadrado até 10.000 pés quadrados, disse Marshall, e US$ 1,50 por pé quadrado excedente.

Até o momento, os proprietários de imóveis no Vale de Las Vegas já removeram mais de 200 milhões de pés quadrados de grama, convertendo a área em paisagismo que requer pouco consumo de água, disse Marshall. Isso equivale a algo como 72 mil projetos individuais.

“É gramado suficiente para envolver uma faixa de grama de 18 polegadas de largura ao redor da circunferência da Terra”, disse ele.

Isso se traduz em 11,2 bilhões de galões de água economizados apenas no ano passado, 163 bilhões de galões desde o início do programa, disse Marshall.

No mesmo período, a população do vale cresceu 49%, mas a quantidade de água retirada do Rio Colorado diminuiu 26%, disse Bronson Mack, porta-voz da empresa hídrica.

Um programa de descontos semelhante do Metropolitan Water District de Los Angeles, em 2015, estimou economizar até 26 bilhões de galões de água por ano, informou o [jornal] Los Angeles Times.

No Colorado, o programa de substituição de grama [da cidade] de Greeley, chamado Life after Lawn [ou Vida após Gramado], é mais jovem, mas ainda bem-sucedido, disse a gerente de conservação de água Dena Egenhoff. Desde o lançamento em 2018, o programa ajudou os proprietários a substituir mais de 150 mil pés quadrados de grama, economizando cerca de 32 milhões de galões de água.

O programa não apenas economiza água, mas também economiza dinheiro dos proprietários e suas novas plantas nativas prosperam muito melhor no clima seco do Colorado, disse Egenhoff.

“Eles reduzem suas contas de água e ainda podem ter uma bela paisagem, não importando quais sejam as condições climáticas agora ou no futuro”, disse ela.

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Jardim com plantas nativas demandam menos água do que áreas gramadas. Foto: cortesia Pixabay

O programa de substituição de grama de Castle Rock também economizou milhões de galões. De acordo com o supervisor de eficiência hídrica Rick Schultz, a cidade reduziu o uso de água residencial em 7% desde o início do programa de substituição em 2009. Propriedades não residenciais tornaram-se elegíveis para os descontos uma década depois e desde então reduziram o uso de água em torno de 29%, ele disse.

Schultz disse que Castle Rock não dita como as pessoas substituem seus gramados, mas oferece um banco de dados de plantas nativas cheio de centenas de opções de gramíneas, flores e arbustos que prosperam no alto deserto.

Ele chama isso de Colorado-scaping [menos landscaping com grama].

“Queremos que pareça regionalmente apropriado”, disse Schultz. “Promovendo uma paisagem que se encaixe na aparência do Front Range do Colorado.”

Algumas pessoas vão com sálvia russa e mandioca, disse ele. Outros vão com switchgrass [tipo de grama norte-americana] ou grama de pena mexicana.

Alguns não plantam nada e, em vez disso, instalam decks, fogueiras ou gramados artificiais, disse ele. Contanto que use menos água, provavelmente se qualifica.

“Algumas pessoas se tornam realmente criativas com isso”, disse ele.

A natureza voluntária do programa elimina grande parte da controvérsia, reconheceu Schultz também.

Além disso, muitos residentes do Colorado já estão interessados, acrescentou Egenhoff. A [cidade de] Greeley entrevistou recentemente mais de 700 pessoas e 59% delas manifestaram interesse em substituir seus gramados e a maioria citou o custo como a principal barreira.

Os programas de substituição de grama existentes funcionam, mas cobrem apenas cerca de um quarto da população do estado, disse Laura Belanger, engenheira de recursos hídricos da Western Resource Advocates, aos legisladores durante a audiência do comitê em fevereiro.

A proposta estadual, que começaria com cerca de US$ 4 milhões, poderia expandir os programas existentes e ajudar a iniciar novos, disse Belanger.

Representantes da Associação de Pecuaristas do Colorado e do Distrito do Rio Colorado já entraram na conversa, apoiando a medida.

Além disso, esse tipo de esforço de conservação pode ajudar a aliviar a pressão da indústria agrícola, disse Catlin.

O plano de contingência da seca do estado, finalizado em 2019, inclui um programa que paga aos agricultores para não plantar culturas e, em vez disso, enviar sua água a jusante.

Da mesma forma, o programa de substituição de grama é outra maneira eficaz de gerenciar a crescente demanda de água do estado, disse Catlin. Ele não exigiria tipos específicos de plantas que poderiam ser usadas ​​para substituir gramados mais dependentes de água e, em vez disso, deixaria essa decisão para os programas locais.

O comitê aprovou por unanimidade a proposta, encaminhando-a ao Comitê de Apropriações da Câmara, onde deve ser ouvido nas próximas semanas. Se a medida for promulgada em lei, o Conselho de Conservação Hídrico do Colorado teria que desenvolver um programa estadual de substituição de grama até julho de 2023.

Artigo original (em inglês) publicado por Conrad Swanson no jornal The Denver Post.


Sobre o autor
Conrad Swanson escreve para o Denver Post sobre o meio ambiente e a política do Colorado. Natural de Iowa, ele se juntou ao jornal em novembro de 2019 após passagens pelo Colorado Springs Gazette, Lawrence Journal World no Kansas e Sioux City Journal em Iowa. Ele é graduado pela Universidade de Iowa com bacharelado em jornalismo e foco em economia.

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